
A vida e a obra de Hemingway têm intensa relação com a Espanha, país onde viveu por quatro anos. Uma breve passagem, mas marcante para um escritor americano que estabeleceu uma relação emotiva e ideológica com os espanhóis. Em Pamplona, meados do século XX, fascinado pelas touradas, a ponto de tornar-se um toureiro amador, transporta essa experiência para dois livros: O Sol Também Se Levanta (1926) e Por Quem os Sinos Dobram (1940). Ao cobrir a Guerra Civil (1937) – como jornalista do North American Newspaper Alliance, não hesitou em aliar-se às forças republicanas contra o fascismo.
Ainda muito jovem, decidiu ir à Europa pela primeira vez, quando a Grande Guerra assombrava o mundo (1918). Hemingway havia terminado o segundo grau em Oak Park e trabalhado como jornalista no Kansas City Star. Tentou alistar-se, mas foi preterido por ter um problema na visão. Decidido a ir à guerra, conseguiu uma vaga de motorista de ambulância na Cruz Vermelha. Na Itália, apaixonou-se pela enfermeira Agnes Von Kurowsky, sua inspiração na criação da heroína de Adeus às armas (1929) – a inglesa Catherine Barkley. Atingido por uma bomba, retornou para Oak Park que, depois do que viu na Itália, tornou-se monótona demais.
Casamentos
Volta à Europa (Paris), em 1921, recém-casado com Elizabeth Richardson, seu primeiro casamento, com quem teve um filho. Na ocasião, trabalhava para o Toronto Star Weeky. Para um escritor em início de carreira, a Paris dos anos 20 era o lugar certo. Hemingway aproximou-se de outros principiantes: Ezra Pound (1885 – 1972), Scott Fitzgerald (1896 – 1940) e Gertrude Stein (1874 – 1940).
O seu segundo casamento (1927) foi com a jornalista de moda Pauline Pfeiffer. Com ela teve dois filhos. Em 1928, o casal decidiu morar em Key West, na Flórida. O escritor sentiu falta da vida de jornalista e correspondente internacional. O casamento com Pauline era instável. Nessa época conhece Joe Russell, dono do Sloppy Joe’s Bar e companheiro de farra. Já na década de 30, resolveu partir com o amigo para uma pescaria. Dois dias em alto-mar que terminaram em Havana, capital cubana, para onde voltava anualmente na época da corrida do agulhão (entre os meses de Maio e Julho). Hospedava-se no hotel Ambos Mundos, em plena Habana Vieja, bairro mais antigo da cidade que se tornava o lar do escritor, e os cenários que comporiam sua história e a da própria ilha pelos próximos 23 anos. Duas décadas de turbulências que teriam como desfecho a revolução socialista e o suicídio do escritor.
Em Cuba, o escritor se apaixonou por Jane Mason, casada com o director de operações da Pan American Airways e tornaram-se amantes. Em 1936, apaixona-se novamente, desta feita pela destemida jornalista Martha Gellhorn, motivo do segundo divórcio, confirmando o que predisse seu amigo, Scott Fitzgerald, quando eles se conheceram em Paris: “Você vai precisar de uma mulher a cada livro”. Assim, Hemingway partiu para a Espanha, onde Martha já estava e, no meio da guerra, os dois viveram um romance que resultou no seu terceiro casamento. Quando a república caiu e a Europa vivia o prenúncio de um conflito generalizado, Hemingway retornou para Cuba com Martha.
Em 1946, o escritor casa-se pela quarta e última vez com Mary Welsh, também jornalista, mas tímida e disposta a viver ao lado de um Hemingway cada vez mais instável emocionalmente.
Suicídio
Ao longo da vida do escritor, o tema suicídio aparece em escritos, cartas e conversas com muita frequência. Seu pai suicidou-se em 1929 por problemas de saúde (diabetes) e financeiro (havia perdido muito dinheiro em especulações na Flórida). Sua mãe, Grace, dona de casa e professora de canto e ópera, atormentava-o com a sua personalidade dominadora. Ela enviou-lhe pelo correio a pistola com a qual o seu pai havia se matado. O escritor, atónito, não sabia se sua mãe estava querendo que ele repetisse o acto do pai ou que guardasse a arma como lembrança.
Aos 61 anos e muito doente (hipertensão, diabetes, arteriosclerose, depressão e perda de memória) Hemingway acabou com a própria vida, assim como fizera o seu pai.
Todas as personagens deste escritor se defrontaram com o problema da "evidência trágica" do fim. Hemingway não pôde aceitá-la. A vida inteira jogou com a morte, até que, na manhã de 2 de Julho de 1961, em Ketchum (Idaho), pegou na caçadeira e disparou contra si mesmo.
Curiosidades
Está nos arquivos do FBI: Ernest Hemingway foi mesmo o espião americano em Cuba. O jornal The Sunday Times localizou documentos que comprovam definitivamente o envolvimento do autor de O Velho e o Mar com espionagem. Em troca de uma bagatela – 500 dólares por mês –, ele transmitia informações ao governo americano sobre pessoas que frequentavam a sua casa em Cuba, no começo da década de 40. No final da vida, o próprio escritor contava histórias a respeito de seu círculo de informantes na ilha. Tudo indica que uma "causa nobre" o motivou a princípio. Em 1941, com a II Guerra Mundial em andamento, pareceu-lhe importante vigiar os possíveis simpatizantes do fascismo em Cuba, país onde mantinha residência havia alguns anos. Hemingway expôs a ideia ao embaixador americano no país, Spruille Braden, que concordou em apoiá-lo. O escritor, então, reuniu um grupo de informantes e passou a coordena-lo. Para o governo dos Estados Unidos, ele era o "agente 08". Washington ainda providenciou fundos para que ele reformasse seu iate, o Pilar, e navegasse pelos mares caribenhos à procura de submarinos alemães.
A primeira vez em que um lote de documentos veio à luz, com informações sobre as actividades de Hemingway como agente secreto, foi em 1983. O biógrafo Jeffrey Meyers desentranhou dos arquivos do FBI um dossier detalhado a respeito do escritor, mostrando que o poderoso órgão de inteligência, comandado na época por Edgar Hoover, tinha conhecimento das iniciativas de Hemingway – e desaprovava-as, por considerá-lo simpatizante do comunismo. São relatórios assinados pelo agente Robert Leddy, com detalhes sobre o funcionamento da rede de espiões de Hemingway: "Em 30 de Setembro de 1942 fui informado de que ele agora tem quatro homens a trabalhar em tempo integral e catorze colaboradores, entre eles barmans, garçons e outros. O custo é de 500 dólares por mês".
O desejo de “escrever o que realmente aconteceu na vida real” sobre assuntos de relevância para a condição humana levou Hemingway aos mais diversos lugares do planeta: à Itália, durante a primeira guerra mundial; a Paris, quando a capital francesa era o centro literário e cultural do mundo; à Espanha, durante a guerra civil; à África; a Cuba; à China, durante a invasão japonesa; e à Inglaterra, durante a Segunda Guerra Mundial. Nestes lugares ele teve a oportunidade de tecer relatos de estilo jornalístico que se desdobram sobre temas centrais para a experiência humana no século vinte: a guerra, o crime, o medo da morte, o amor, a perda. Traçou assim um esboço do que preocupava e afligia as pessoas de sua geração e descreveu um mundo moderno que pode ser perigoso e muitas vezes nocivo e amoral.
Existe a lenda que a família Hemingway é perseguida por uma maldição. Um dos filhos de Ernest, Gregory Hemingway, sofria de graves crises depressivas, apenas amenizadas pelo travestismo. O neto, John Hemingway, sofreu um ataque cardíaco aos 38 anos de idade. Uma bela prima de John, Margaux Hemingway, foi capa da revista Time, mas também teve morte prematura.
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